quinta-feira, 3 de março de 2016

Peso da verdade

Havia quase uma centena de pessoas naquela reunião popular em Jundiapeba. Era mais uma etapa da jornada desenvolvida no ano 2000 para elaboração do PGP – Plano de Governo Participativo, instrumento que se tornou a bússola dos meus dois mandatos como prefeito de Mogi das Cruzes. Manifestações acaloradas, discussões paralelas, burburinhos, o furor que vem a reboque de um tema polêmico: a saúde pública. Todos queriam opinar ao mesmo tempo. Em meio ao alvoroço, uma jovem grávida ergueu o braço e se apresentou. 

Chamava-se Maria, tinha 27 anos, seis filhos e o sétimo a caminho. Nunca fizera um exame de prevenção do colo do útero. A filha mais velha, de 14 anos, entrara no quinto mês de gestação sem ter passado por um único exame pré-natal. 

"Puxei esse relato da memória para propor
uma reflexão sobre a importância da mulher."
Instalou-se o silêncio, testemunha da relação de identidade firmada com a história que ela trazia. Maria prosseguiu dizendo que uma consulta com ginecologista parecia quase tão difícil quanto enfrentar as dores do parto. E se a criança já não tinha assistência no ventre da mãe, também não receberia cuidados adequados depois de nascer. Nada de pediatra; só clínico geral. 

Maria expressava-se com desenvoltura escancarando refinado conhecimento do dramático panorama da saúde pública. Mãe, filha, esposa e, em poucos meses, também avó, defendia maior atenção à mulher e a medicina preventiva. Falou com a dignidade de cidadã. Aos ouvintes, provou que a experiência emerge como sábia mestra de quem tem a humildade de aprender. 

O que Maria não sabia é que seu depoimento seria a semente para começar a revolução na saúde pública de Mogi das Cruzes. Assumi a Prefeitura em 2001 com uma filosofia de governo alicerçada na qualidade de vida dos moradores. Significa que o ser humano vem em primeiro lugar. Tudo mais tem de ser ajustado a esse propósito. Os cuidados começam quando ele ainda está na barriga da mãe. E se estendem ao longo de sua existência. Foram conceitos de prática obrigatória em todas as áreas da administração municipal. 

Para enfrentar as graves deficiências da saúde, reorganizamos e modernizamos a estrutura, e investimos pesado – sempre além do que manda a legislação – para ampliar a rede de atendimento, a frota de ambulâncias e, principalmente, a equipe de profissionais. Ao longo de três anos, perseguimos os meios para consolidar o projeto capaz de garantir às mulheres de todas as idades um tratamento especial. Em 8 de março de 2004, inauguramos a primeira unidade do Pró-Mulher. A segunda, em Braz Cubas, chegaria dois anos depois.

Foi o meio de prestar uma homenagem cotidiana às mulheres, sob a forma de assistência especializada e de serviços que incluíam programas de prevenção, planejamento familiar – de orientação até encaminhamentos para laqueadura e vasectomia –, gestação segura, acompanhamento e de saúde bucal para gestantes e bebês. 

Houve uma série de outras iniciativas para melhorar a saúde pública na Cidade, tanto em minhas gestões como nas do atual prefeito Marco Bertaiolli (PSD). Puxei esse relato da memória para propor uma reflexão sobre a importância da mulher. É minha singela homenagem às guerreiras celebradas no dia 8 de Março.

Sempre fui cercado por grandes mulheres, de quem sou um eterno devedor. Delas, aprendo um pouco todo dia. E me torno um ser humano mais sensível e essencialmente grato. A Deus, à vida, ao mundo. Falo de gente guerreira que não foge da raia e, apesar da aparente fragilidade, faz emergir uma força sobrenatural capaz de superar os maiores obstáculos. 

São exemplares femininos que, por si, justificam a existência de um dia em homenagem à mulher. Penso que todos os dias deveriam ser especiais para elas. São guerreiras inatas, cada qual com suas habilidades, encantos e peculiaridades. Rezo a Deus para que proteja e ampare todas no planeta. Apelo aos homens que se esforcem um pouco mais para serem dignos da presença delas. Que aprendamos com elas o indescritível significado de gerar vida. Acima de tudo, que saibamos ouvi-las sempre. Afinal, uma delas pode dizer aquilo que mudará o curso da história. Como fez Maria, a jovem que inspirou a revolução da saúde mogiana com o peso da verdade que nunca exagera. E nem exclui. Parabéns, grandes mulheres!

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

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