quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Contramão da saúde

"Além do desequilíbrio do presente, o País acena com futuro nada
promissor para as crianças colocadas na trilha de males como
obesidade, hipertensão e altos índices de colesterol e triglicérides"
A cada dez brasileiros adultos, seis estão com excesso de peso. Em relação há dez anos, subiu de 42,3% para 58,6% a proporção da população que têm problemas com a balança. Não é só. A PNS 2013 (Pesquisa Nacional de Saúde), divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), também mostra que 60,8% dos bebês até 2 anos de idade comem biscoitos e um terço deles já toma refrigerantes ou sucos artificiais. 

O cenário é nítido. Além do desequilíbrio do presente, o País acena com futuro nada promissor para as crianças colocadas na trilha de males como obesidade, hipertensão e altos índices de colesterol e triglicérides. Alimentados com produtos industrializados, ricos em açúcar e gordura, mas pobres em fibras e nutrientes, os pequenos têm quatro vezes mais riscos de desenvolver sobrepeso e obesidade na adolescência e na vida adulta.

Os dados do IBGE mostram ainda que 19% das crianças brasileiras abaixo de 5 anos já apresentam risco de sobrepeso, 7,9% estão acima do peso e 7,35% são obesas. Quanto mais tempo acima do peso, mais difícil é para emagrecer. Um pequeno de 3 anos, que sofre de obesidade, tem 20% de chance de se tornar um adulto obeso. Um obeso, de 18 anos, tem 80% de chance de continuar assim.

Especialistas já se pronunciaram que as políticas públicas contra a obesidade – quase inexistentes na primeira infância – precisam estar centradas na qualidade da alimentação. Traduzindo: não adianta se entupir de gordices e tentar remover os excessos com atividade física. Os cientistas alertam que até 40% dos indivíduos com peso considerado normal enfrentarão anormalidades metabólicas, associadas com a obesidade, por causa de hábitos alimentares impróprios.

Definitivamente, o mal pode estar no que entra pela boca. O desenvolvimento de uma dieta balanceada não exige grande sacrifício. É ideal ingerir, no mínimo, 400 gramas de alimentos saudáveis por dia e, aos poucos, chegar a 600 gramas diários. Parece muito? Corresponde a um copo de salada de frutas, uma maçã, uma banana ou meio prato grande de salada por dia.

A reformulação da dieta alimentar para incluir no cardápio mais hortaliças e frutas trará resultados diretos para a saúde pública. No Brasil, menos de um terço da população come esses alimentos diariamente. Doenças que causam grande procura por atendimento médico poderiam ser evitadas com alimentação adequada. O baixo consumo de itens de alto valor nutritivo, baratos e produzidos em farto volume no País contrasta com a realidade nacional onde a subnutrição ainda faz vítimas. Precisamos sair da contramão da saúde.

Não é de hoje que prego a necessidade de políticas públicas para orientar a dieta alimentar do brasileiro, com o aumento do consumo de hortaliças e frutas. São produtos ricos em nutrientes, fibras e com baixo valor calórico, que integram a categoria do agronegócio voltada ao mercado interno, exponencial na Região do Alto Tietê, e capaz de propiciar tantos benefícios à saúde. 

Cada brasileiro consome, por ano, 27 quilos de hortaliças e 57 quilos de frutas. Significa uma quantidade de verduras e legumes seis vezes menor do que aquela ingerida anualmente pelo italiano (158 kg) e apenas um quarto do consumo anual de frutas registrado pelo canadense (223 kg). O hábito alimentar começa no nascimento e o costume não é formado só em casa. A escola tem papel fundamental no processo. Muitas prefeituras procuram inserir, cada vez mais, alimentos saudáveis na merenda escolar. Reforçamos isto, enquanto prefeito de Mogi das Cruzes. O trabalho teve continuidade com o atual chefe do Executivo mogiano. Não basta. É preciso consciência geral, com ações efetivas dos governos, o apoio do setor produtivo e o cuidado das famílias.

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Direito à transparência

Quem é assalariado sabe que, todo mês, a empresa desconta do seu salário a contribuição para o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Mas, será que os valores descontados estão indo, de fato, para o órgão federal? Muita gente tem péssimas surpresas. Ao preparar a documentação para aposentadoria, descobre que uma das firmas, onde trabalhou por décadas, jamais fizera os recolhimentos previdenciários, embora tenha efetuado os descontos. Pior: a empregadora nem existe mais. O fato não prejudica a concessão de benefícios, mas o trabalhador não tem de sofrer tamanho aborrecimento por causa do crime de maus empregadores.

Caso semelhante trazido por uma moradora de Mogi das Cruzes chamou minha atenção para o problema. O melhor meio de evitar transtornos é garantir o acesso contínuo do trabalhador às informações previdenciárias. Foi o que fiz. E fiquei feliz ao saber que o projeto de Lei (2093/2011), elaborado por mim na Câmara Federal, não ficou enterrado na Casa.

Quando um legislador deixa o Parlamento, todos os projetos de sua autoria, que estão em andamento, são automaticamente arquivados no último dia do seu mandato. Ocorre que o deputado Luciano Ducci (PSB-PR) resgatou minha proposição para apresentar, em junho último, o projeto de Lei 2003/2015.

A proposta obriga os bancos a fornecer para seus correntistas acesso gratuito aos extratos de informações previdenciárias contidas no CNIS. O Cadastro Nacional de Informações Sociais traz vínculos de emprego e remunerações do trabalhador, que servem de referência para o cálculo das contribuições, de benefícios e para indicar data de aposentadoria. Basta a aprovação do projeto para o documento ser disponibilizado nos terminais de autoatendimento ou nos sites das instituições bancárias na internet. 

A pretendida legislação garantirá ao trabalhador o direito de acompanhar se o empregador está recolhendo as contribuições previdenciárias descontadas do seu salário. Assim, será possível providenciar a correção de eventuais omissões ou erros nos registros, antes da data programada para a aposentadoria ou do requerimento de qualquer benefício previdenciário.
"A pretendida legislação garantirá ao trabalhador o direito de acompanhar se o empregador
está recolhendo as contribuições previdenciárias descontadas do seu salário"

Queremos estender a toda rede bancária nacional um processo já existente nos bancos oficiais federais. O compartilhamento de informações previdenciárias é conduzido pelo INSS por meio de convênio de cooperação técnica que, segundo o projeto em trâmite, também seria firmado com instituições privadas. 

O projeto tem apreciação conclusiva pelas comissões de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática; de Seguridade Social e Família; de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Ou seja, havendo unanimidade pela aprovação, a proposta recebe aval automático da Câmara e segue para o Senado, sem necessidade de ser votada no plenário da Casa. 

A meta de democratizar o acesso à informação estará assegurada pela progressiva vinculação dos trabalhadores à rede bancária – presente em todo o País. A oferta do serviço gratuito aos correntistas acarretará aos bancos custos pouco significativos, perfeitamente administrados pelo sistema financeiro que têm a importante, porém, esquecida função social de servir aos interesses da coletividade, como estabelece a Constituição. 


Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Questão de bom senso

"Não aceito a inércia do poder público frente à polêmica que já
sinalizava para a multiplicação de casos de violência"
Casal é forçado a descer de carro conduzido por motorista da Uber. Na mesma semana, o marido de uma jornalista é agredido porque ambos estavam usando o serviço do aplicativo. Um dia depois, condutor do mesmo transporte alternativo sofre sequestro e agressão. Os acusados destes crimes destacados na mídia são taxistas. Os conflitos entre as duas categorias já ultrapassaram as raias da civilidade e tudo tende a se agravar. Não aceito a inércia do poder público frente à polêmica que já sinalizava para a multiplicação de casos de violência.

De um lado, está a categoria profissional dos taxistas. Devidamente instituída, regulamentada e fiscalizada. É cumpridora do arsenal de exigências – renovações de alvará e licença especial de condutor, entre outras –, refém da truncada burocracia, pagadora de severos impostos e detentora de poucos privilégios, como o de comprar carro cerca de 20% mais barato graças à isenção de IPI/ICMS e não ter de arcar com o IPVA (caso de taxista autônomo). 

De outro, estão os motoristas autônomos cadastrados no Uber que não têm isenções nem exigências legais. Decidem se aceitam ou não uma corrida. Mas, precisam destinar 20% do valor de cada uma para o aplicativo. Em ambos os casos, por trás do impasse, estão pessoas que trabalham para sobreviver e sustentar suas famílias. 

Se os avanços da tecnologia proporcionaram a existência de mais um modelo de transporte, a sociedade é livre para ter acesso a ele. Desde que seja devidamente regulamentado. É para isto que existem legisladores. E o Executivo não pode se dar ao luxo de ser omisso. O que me indigna é a displicência com que o assunto vem sendo tratado.

O Uber opera em mais de 250 cidades de 55 países de todo o mundo. Só na Europa, a companhia enfrenta ações legais na Espanha, França, Alemanha, Bélgica e Holanda. Portanto, o Brasil já deveria ter se preparado para a entrada da atividade no mercado nacional. Mesmo com atuação, a pleno vapor, nas principais capitais brasileiras, o aplicativo permanece sem regulamentação. 

O brasileiro usuário da Uber escolhe entre duas faixas, popular e de luxo. A primeira opera com carros populares e cada corrida sai em torno de 30% mais barata que a de um táxi da Capital, no período diurno. Já a outra prevê deslocamentos em automóveis sofisticados, com valor 5% acima do cobrado pelo táxi regular. Quem utiliza o aplicativo aponta a rapidez na chegada do veículo e a qualidade do atendimento (atenção, gentileza, etc.) prestado pelos motoristas – e não o preço – como as principais vantagens. É mais uma amostra de que a disputa pela preferência do cliente tem tudo para ser saudável. Desde que a atuação da Uber esteja devidamente regulamentada. 

O poder público não pode deixar tudo correr solto e fingir que não está vendo. Se impõe regras para uma categoria, tem obrigação de fazer o mesmo para a outra. Luto vigorosamente pela regulamentação do sistema de carona remunerada, baseado no aplicativo. Esta medida extirpará eventuais privilégios dos condutores da Uber, dará a devida segurança aos usuários, normatizará a igualdade das duas classes de profissionais e fará justiça. Só, então, valerá a livre concorrência no mercado. É uma questão de bom senso.

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)


Crédito da foto: Arquivo/Heleno Rezende

quinta-feira, 6 de agosto de 2015

Tratamento de doenças raras

Nada menos que 13 milhões de brasileiros sofrem com alguma doença rara. Destes, a maciça maioria não dispõe de recursos financeiros para bancar os dispendiosos procedimentos médicos e remédios. Para os portadores de pelo menos uma das enfermidades, a luz se acende no fim do túnel. Falo das vítimas da MPS (mucopolissacaridose), doença metabólica hereditária, altamente devastadora e progressiva.

É que a Câmara dos Deputados retomou a análise do projeto de Lei (2747/2011) que apresentei. A proposta obriga o SUS (Sistema Único de Saúde) a distribuir, gratuitamente, todos os medicamentos necessários para o tratamento da mucopolissacaridose e de seus sintomas. Havia sido arquivada em 31 de janeiro último, data final do meu mandato na Casa. Porém, foi desarquivada a pedido do deputado Felipe Bornier (PSD-RJ) que permanece como titular e tinha uma proposição (2869/2011) apensada a minha.

Além da gratuidade no tratamento da MPS, meu projeto estabelece que a União padronizará a medicação a ser utilizada, de acordo com os protocolos clínicos aprovados pela comunidade científica, assim como fará constante atualização para incorporar produtos inovadores ao processo.

A matéria já recebeu parecer favorável na Comissão de Seguridade Social e Família, a primeira de três pelas quais terá de passar. Se também tiver o sinal verde das comissões de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania, será aprovada e seguirá direto para o Senado, sem necessidade de passar pelo plenário da Câmara. 

O tratamento da MPS acarreta custos que podem superar R$ 1,5 milhão por ano, o que não deixa outra alternativa aos enfermos, senão recorrer ao sistema público de saúde. Conheço bem o drama dos portadores de mucopolissacaridoses. Tive contato com o problema por meio da Regina Próspero, presidente da Abramps (Aliança Brasil de Mucopolissacaridose), de quem me tornei amigo.

"Regina é uma guerreira, destas mulheres especiais que tiram forças
não sei de onde para enfrentar as adversidades e ainda confortar outros"
Regina é uma guerreira, destas mulheres especiais que tiram forças não sei de onde para enfrentar as adversidades e ainda confortar outros que, como ela, estão órfãos da ajuda do poder público. Tem uma história de luta pelo tratamento da doença que lhe tirou um filho de seis anos de idade e maltrata o outro, Luis Eduardo Próspero, o Dudu, de 24. 

Mesmo com deficiência visual e o sofrimento decorrentes da doença, Dudu trabalha na área jurídica e concluiu a faculdade de Direito. É um dos cerca 650 portadores de MPS, diagnosticados no País. Por ser uma enfermidade rara, muitos casos permanecem sem diagnóstico porque nem sempre os médicos conseguem identificar o problema. O diagnóstico precoce aumenta as chances de um acompanhamento adequado. Vale frisar que a atenção tem de se estender aos familiares.

A União se mostra muito distante de problemas como os que afligem os portadores de MPS. A ausência da medicação para tratar a moléstia obriga os pacientes a recorrerem à Justiça, o que implica na espera de, em média, um ano até a ordem para oferta dos medicamentos. Enquanto o tempo passa, a doença progride, os sintomas se agravam e a expectativa de vida fica cada vez menor.

Embora a responsabilidade por prover a assistência seja do SUS, quando o tratamento é exigido por meios judiciais são as prefeituras que assumem os custos com a medicação. Ocorre que, em muitas cidades, o orçamento é tão reduzido que mal cobre as despesas com o funcionalismo. Resultado: o paciente que já esperou tanto, é penalizado mais ainda. A vigência da legislação proposta obrigará o governo federal a prestar o atendimento aos portadores de MPS.

Não é de hoje que há falta generalizada de medicamentos, principalmente os de alto custo, nas farmácias do SUS. O tratamento gratuito da MPS é uma das medidas que o governo precisa adotar. Afinal, o Ministério da Saúde tem obrigação de garantir aos cidadãos o direito constitucional de acesso aos remédios. Como parte da sociedade, é nosso papel intensificar a vigilância e as cobranças. 

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)