quinta-feira, 23 de julho de 2015

Agregar valor para evoluir

De 2003 para cá, apesar dos benefícios do Plano Real (1994), o Brasil gastou demais. Pior: não fez a lição de casa elementar, calcada nas reformas política, tributária, previdenciária e trabalhista, nos investimentos em infraestrutura – saneamento, ferrovias, portos e aeroportos – e, principalmente, na educação, com ensino de qualidade para se inserir no mundo globalizado. 
"O poder público só deu o peixe subnutrido. Não ensinou
a pescar e sequer deu a vara de pesca"

Governantes populistas aplicaram no social sem estabelecer metas de crescimento individual. Nada contra o investimento social. Tudo contra a ambição eleitoreira que deslocou milhões de brasileiros para a condição de eternos dependentes. O poder público só deu o peixe subnutrido. Não ensinou a pescar e sequer deu a vara de pesca. 

Despreparado para enfrentar a crise econômica global de 2008, o governo substituiu o já aniquilado PIB industrial de exportação pelo vulnerável consumismo de mercado interno. O resultado é a instabilidade econômico-social – com sete em cada dez famílias endividadas –, agravada pelo bombástico caos de ordem política, ética e moral.

Especialistas convergem para um ponto: estamos no início de uma enorme crise, sem perspectivas de deflagrar o processo de superação nos próximos três anos. Isto, somado ao nível de desemprego que já atinge 8,2 milhões de pessoas. No mês passado, 111.199 trabalhadores com carteira assinada perderam seus empregos. Nos últimos 12 meses, sumiram 601.924 postos de trabalho. 

Na expectativa de que a conjuntura atual seja temporária, vale frisar que o Brasil precisa se libertar da exportação concentrada em commodities. São matérias-primas, de baixo valor agregado, negociadas no mercado internacional por preços que dependem de circunstâncias, como oferta e demanda. Embora minério de ferro, alumínio, ouro, petróleo, madeira, soja, milho, café, algodão, laranja, cacau e outras commodities nacionais sustentem a economia, é urgente investir na transformação manufaturada desses produtos primários em derivados agregados de valores e qualidades.

Falo de exportar em vez de minério de ferro, aço de qualidade; de cacau, chocolate; de algodão, roupas; e assim por diante. É o que muitos países praticam, há anos. Multinacionais americanas exportam Sucrilhos (Kellogg’s) e salgadinhos como Fandangos (PepsiCo), em vez de milho; ou bombons (Kraft Foods-Lacta), em vez de cacau. A suíça Nestlé negocia uma infinidade de produtos lácteos em vez de leite. Só para ilustrar, empresas chinesas exterminaram a indústria têxtil nacional, exportando roupas, grande parte produzida com algodão brasileiro. 

Uma referência saudável de sofisticação da estrutura produtiva é a mogiana MN Própolis. A empresa transforma mel in natura em produtos de alto valor agregado, como própolis, geleia real, cosméticos, chá com própolis e medicamentos para faringite e laringite, entre outros. 

É uma estratégia que abre horizonte infinito sob a ótica de economia diversificada, com sustentabilidade. Além de alavancar atividades para empreendedores de todos os portes, também gera milhões de empregos, impostos e riquezas para o País, com exportação e comércio interno.

Já se faz tarde a atuação incisiva do governo federal para elevar o grau de sofisticação da estrutura produtiva nacional. Significa planejar, coordenar, fomentar e implementar, imediatamente, ações para o fortalecimento de atividades já existentes. Seria viável com um consistente programa nacional unificado, desenvolvido em integração com estados, municípios e entidades representativas da sociedade civil para respeitar os arranjos produtivos locais. A iniciativa ainda poderia contar com o apoio de instituições privadas, como Senai, Sebrae, Senac, Senar e outras.

O programa investiria em nosso capital humano, proporcionando capacitação profissional e valorizando talentos. A curto prazo, o País teria mão de obra qualificada em abundância, premissa para a produção de alta tecnologia. Precisamos corrigir o rumo para frear a queda da distribuição de renda no País. 

Estudo do MIT (Massachusetts Institute of Technology) revelou que o grau de sofisticação da estrutura produtiva afeta as tendências da distribuição de recursos entre a população. O Brasil despencou 22 posições, entre 1995 e 2013, no “Atlas de Complexidade Econômica”, que classifica os países segundo a sofisticação dos produtos que exportam.

Produtos de exportação mais sofisticados e complexos (com valores agregados) tendem a ser um bom indicador da distribuição de renda. Quanto mais as nações exportam e importam, maior seu acesso a tecnologias inventadas fora. O processo também garante terreno mais fértil ao empreendedorismo e à inovação. 

Trata-se de uma dinâmica factível que abriria horizontes de esperança e dignidade para aqueles que participam do importante Bolsa Família, mas se sentem angustiados pela escassez de oportunidades para avançarem em conquistas cidadãs e sepultarem a longa ou quase eterna dependência. Triste é saber que, por absoluta falta de interesse ou coragem política, o País corre o risco de perder o bonde da história no combate às desigualdades socioeconômicas.

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

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