quinta-feira, 25 de junho de 2015

Pelo fim de reformas meia-boca

A tão esperada reforma político-partidária virou comédia no Congresso. Pouco muda o cenário atual e em nada melhora a conexão entre representante e representado. Muito menos, moraliza as relações nada saudáveis entre Executivo e Legislativo. Tudo vem sendo feito sem qualquer discussão com a sociedade e sem a mínima avaliação do impacto que cada mudança poderia trazer. É como se os parlamentares atuassem dentro de uma redoma de aço inoxidável. 

O destino da reforma político-partidária, que não vai acontecer, é exatamente o mesmo de outras imprescindíveis para corrigir o prumo da Nação. A primeira já está fadada ao naufrágio. Igual perspectiva existe para as demais. O erro original está na forma de executá-las.

"É impossível acreditar que os parlamentares, no exercício de
suas funções, aprovem algo que possa não lhes ser benéfico."
É impossível acreditar que os parlamentares, no exercício de suas funções, aprovem algo que possa não lhes ser benéfico. O que se vê é cada um puxando a sardinha para sua brasa. Não sobra peixe nenhum para o braseiro coletivo, aquele do interesse público, que se converterá nas melhores escolhas para a população brasileira.

Como os interesses individuais são fortes e superam os princípios morais da defesa dos benefícios à coletividade, o Parlamento se transforma em puxadinho do Executivo, que exerce de forma nojenta seu poder de compra. E, quando o governo é fraco – como o atual – fica de cócoras. Não ao Congresso, mas, vergonhosamente aos interesses de alguns parlamentares. E o País que se estrepe. É preciso impor freios à esta relação promíscua. 

Como predomina um processo purulento de busca de vantagens pessoais por meio da influência de ordem política e partidária, os custos dos nossos três Poderes são altíssimos. Considerando a promiscuidade da interface entre governo e Parlamento, determinadas CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito) têm efeito puramente midiático. E acabam, sim, em pizza. 

Sei bem disso porque estive no Congresso por quatro anos. As reformas político-partidária, tributária, previdenciária e trabalhista, entre outras medidas essenciais para melhorar a qualidade de vida do povo brasileiro, só serão realidade com uma profunda reformulação constitucional, executada por brasileiros com elevado espírito público, despojados de ideologia partidária e fora de qualquer função pública.

Cultivando uma das bandeiras do meu partido, o PSD (Partido Social Democrático), insisto em uma Assembleia Nacional Constituinte que, eleita pelo povo, terá a missão de revisar toda a Constituição Federal. Isto já chegaria com enorme atraso. A primeira revisão deveria ter sido executada cinco anos após a promulgação da Carta Magna, ou seja, mais de duas décadas atrás. 

A ausência dos ajustes constitucionais forma o quadro de remendos e inserções oportunistas prejudiciais ao País. O trabalho fica comprometido em razão de interesses dos próprios políticos, de suas amarras partidárias, de suas vinculações com determinados grupos sociais, enfim, não há isenção para a grandiosa tarefa de nortear os rumos da Nação.

O único jeito de evitar o festival de reformas meia-boca é a eleição, pelo povo, de constituintes, com dois anos de mandato, que teriam a incumbência de revisar a Constituição Federal. Seriam especialistas nas mais diversas áreas, integrantes de organizações sociais, enfim, brasileiros interessados em ajudar o País. O grupo não receberia salários – apenas ajuda de custo para deslocamentos, alimentação e estada, por exemplo. Nem seria integrado por congressistas já eleitos. 

Angustiante é conviver com remendos constitucionais e improvisações oportunistas, enquanto um pacto federativo superado impõe a municípios, Estados e à própria União limitações grotescas, constrangimentos e falta de recursos para dar aos brasileiros serviços dignos de saúde, educação, segurança, justiça e oportunidade igual para todos.

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

Crédito da foto: Arquivo/Saulo Cruz

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Inspiração para a paz

Brasil e Japão comungam a celebração do 120º Aniversário do Tratado de Amizade, Comércio e Navegação que oficializou a Imigração Japonesa no território brasileiro, com o desembarque dos primeiros imigrantes no porto de Santos, em 18 de junho de 1908. Desceram do lendário navio Kasato Maru 165 famílias, totalizando 781 pessoas. Foi o marco do intrínseco relacionamento cultivado entre povos de dois extremos do planeta.

Milhares de imigrantes morreram nos sertões brasileiros, vítimas de surtos epidêmicos e males simples que, sem assistência médica, ceifavam vidas e mais vidas. Sobreviveram os heróis da resistência. Em cada palmo de chão por onde passaram, inauguraram novas paisagens. E, com elas, fontes de desenvolvimento econômico e social. 

Imigrantes de todas as nacionalidades que vieram para o Brasil deram sua gigantesca contribuição para o crescimento do País. No caso dos imigrantes japoneses, este 18 de junho merece destaque. Junto com seu devotado trabalho e da sua plena integração com os brasileiros, consolidou-se a relação bilateral Brasil-Japão nos campos econômico, educacional, cultural, tecnológico e social. 

O relacionamento entre os dois países, desde a imigração, tem a participação e permanente contribuição das lideranças nikkeis, por meio de entidades organizadas, como a Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa, Federação das Associações Culturais das Províncias do Japão no Brasil, Associações Culturais e Beneficentes das Províncias do Japão no Brasil, além de veículos de comunicação dirigidos à comunidade nipo-brasileira. Tanto lá como aqui. Também é notória a afinidade entre os órgãos governamentais de ambas as nações, assim como a atuação do Grupo Parlamentar Brasil-Japão – que tive a honra de presidir, na esfera do Poder Legislativo. Tudo, visando o benefício bilateral. 

Passados 107 anos da chegada dos primeiros imigrantes e a plena integração entre ambos os povos, os descendentes honram seus ancestrais desenvolvendo eventos e atividades culturais, esportivos, educacionais e de culinária tradicionais da cultura nipônica. Além disso, os nikkeis registram destacada participação nos diferentes segmentos da sociedade. 

A saga dos imigrantes japoneses no Brasil evoluiu amparada nos conceitos e valores trazidos das origens. O confronto com a dura adaptação no Brasil – de idioma, clima, costumes, tudo desconhecido para os recém-chegados – fez aflorar essas características, exercitadas com maior determinação a cada novo obstáculo. Falo do senso de responsabilidade, seriedade, lealdade, solidariedade, amor ao trabalho, à família e a Deus. Assim, lapidaram a chave da superação. De tudo. Sempre. 
"Melhor forma de honrar a perfeita simbiose estabelecida os dois povos
 é preservar e repassar adiante a altivez dos valores morais que são a
grande herança deixada pelos imigrantes japoneses no Brasil"

Filho e neto de imigrantes japoneses, desde a infância, recebi dos meus ancestrais a missão de amar este País, de todo coração, ajudar o povo em tudo o que for possível e fazer mais pelo Brasil que os próprios brasileiros. A melhor forma de honrar a perfeita simbiose estabelecida os dois povos é preservar e repassar adiante a altivez dos valores morais que são a grande herança deixada pelos imigrantes japoneses no Brasil. 

Dignidade, responsabilidade, trabalho duro, disciplina, respeito, ética, moralidade e amor ao próximo são parte da principal bagagem para a construção de um mundo melhor, justo e mais humano. Sobretudo, o elo fraternal entre os dois países sela uma profunda amizade, materializada em plena integração, que inspira o mundo a perpetuar a paz. 

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

quinta-feira, 11 de junho de 2015

Dignidade das domésticas

Já foi dito que o ser humano deve escolher muito bem sua atividade profissional, porque passará a maior parte da vida trabalhando. Em tempos de crise, com recessão econômica e aumento da taxa de desemprego, fica difícil falar em escolha. De qualquer modo, vale observar algumas tendências do mercado, que deverão se consolidar em pouco tempo.

Uma boa amostra da mudança cultural que começa a ser delineada na sociedade envolve os empregados domésticos. O Brasil caminha para um cenário semelhante ao da maioria dos países europeus, Japão e Estados Unidos, onde os serviços domésticos ficam a cargo da própria família. A presença de um profissional para cuidar das tarefas cotidianas é exclusividade de gente abastada, muito abastada. Os demais têm, no máximo, uma diarista para fazer faxina a cada 15 ou 30 dias. Mesmo assim, pagando uma polpuda quantia por diária.

A chamada PEC das Domésticas, sancionada este mês pela presidente Dilma Rousseff, deverá impulsionar a gradativa mudança no modelo de contratação. Parte das empregadas em serviços domésticos poderá se tornar diarista. A lei que regulamenta os direitos dos trabalhadores domésticos e passará a valer em 120 dias, na verdade, chega com muito atraso. 

"É inconcebível ter empregados domésticos, até hoje, sem
os mesmos direitos dos demais trabalhadores urbanos e rurais"
Em que pese o impacto das medidas no orçamento familiar da classe média, principalmente em tempos de crise econômica, é inconcebível ter empregados domésticos, até hoje, sem os mesmos direitos dos demais trabalhadores urbanos e rurais – como FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), multa rescisória de 40% do fundo de garantia, seguro-desemprego, seguro contra acidente de trabalho e adicional noturno, entre outros. 

Para quem já assina a carteira da doméstica – situação que contempla parcos 14,2% do contingente de 7 milhões de empregados da categoria no País, segundo o Ministério do Trabalho –, os efeitos financeiros das novas regras são pouco significativos. Entretanto, aqueles que se habituaram ao serviço cotidiano de empregado doméstico, mas nunca lhe concederam qualquer direito trabalhista, sentirão bem o peso das regras no bolso. 

Provavelmente, empregadores que ainda se pautavam pela abominável lógica escravagista na relação com as domésticas começarão a migrar para a contratação de diarista, com o objetivo de se verem livres do vínculo empregatício. Pela lei, empregado doméstico é aquele que presta serviços de forma contínua a uma família por mais de dois dias por semana. 

Ao mesmo tempo, a recuperação econômica do Brasil tende a reduzir a oferta de mão de obra para serviços domésticos. A conjuntura atual, marcada pela recessão, interrompeu a queda do número de trabalhadores da categoria, percebida desde 2008, período em que o crescimento nacional ampliou o acesso à educação e a outras opções de emprego. 

Dados do IBGE mostram que a proporção de empregados atuando no mercado doméstico este ano subiu para 6,3% do total de trabalhadores (contra 6,1% de 2014), após sete anos de queda quase ininterrupta. É efeito do cenário econômico desfavorável que dificulta a migração das domésticas para outros postos no setor de serviços. Ou ainda, força o retorno à atividade ou o primeiro ingresso de trabalhadoras neste ramo.

O que se vê no mercado de serviços domésticos é similar ao que ocorre com o trabalhador rural. Quando o meio urbano vai bem, a agricultura passa apuros com mão de obra, porque a cidade exerce um incrível poder de atração sobre as pessoas. Muitos empregados do campo preferem as atividades urbanas, longe da lida sob as intempéries climáticas, além de ter feriados e finais de semana livres.

Defendo e apoio a justa ampliação dos direitos trabalhistas das empregadas domésticas. Como não faço parte do time de pessimistas de plantão, discordo do argumento de que a nova legislação causará dispensa em massa de trabalhadores. Acredito, sim, que o contexto econômico e a própria sociedade brasileira determinarão ajustes no mercado. Seja com mais diaristas em ação, seja com a migração de parte do atual contingente de funcionárias dos lares para outras categorias. Prevalecerá o fundamental: as domésticas que permanecerem atividade terão o devido respaldo legal para trabalharem com dignidade.

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)

Crédito da foto: Arquivo/Heleno Rezende

quinta-feira, 4 de junho de 2015

Um Brasil idoso

Foi-se o tempo em que o idoso era considerado ponto de referência de tão minúscula era sua presença na população brasileira. A pirâmide etária se inverteu por causa do aumento da longevidade e do menor número de nascimentos. O Brasil, antes tarjado como País de jovens, já pode ser considerado maduro e caminha para o cenário existente na Europa. 

Detectada em 1980, a tendência de célere envelhecimento da população vem se cristalizando a cada ano. Em 2030, 20% dos moradores do Estado de São Paulo terão mais de 60 anos. Estudo da Fundação Seade também mostra que, em nossa Mogi das Cruzes, a população idosa irá quase dobrar nos próximos 15 anos, atingindo 87.344 habitantes. 

As projeções significam alerta total para os governantes. Afinal, o Brasil está envelhecendo numa velocidade maior que a das sociedades mais desenvolvidas e prevalece o despreparo em relação à Terceira Idade. Tanto na oferta de serviços públicos quanto no aspecto cultural – especialmente, a maneira como a sociedade trata o idoso. Pouco se tem feito para lidar com esta realidade e menos ainda para enfrentar o cenário que ela projeta.

Há programas de atenção à saúde nas três esferas de governo, mas ainda atendem a poucos idosos e, não raro, são interrompidos. É preciso priorizar desde a prevenção de doenças – uma hipertensão não tratada pode causar derrame – até a criação de cuidados voltados à fase final da vida. Também faltam profissionais especializados no atendimento ao público veterano. 

A população acima de 80 anos será a mais vulnerável e com maior incidência de incapacidades. Neste caso, há o agravante das famílias fragmentadas. Os filhos migram e o idoso acaba sozinho. Em 2012, o Brasil já registrava 3,7 milhões de pessoas acima de 60 anos morando sozinhas. O número mais que triplicou em relação a 1992.

A missão de viabilizar políticas públicas adequadas à Terceira Idade exige empenho do poder público e a participação da sociedade. Demanda múltiplos programas. De saúde e previdência social – com valores justos nas aposentadorias –, passando por esportes e lazer, até iniciativas que proporcionem relacionamento saudável dos mais jovens com os veteranos. 

Voltando ao cenário mogiano, quando fui prefeito da Cidade (2001 a 2008), dediquei especial atenção aos dois extremos mais vulneráveis da população: a criança e o idoso. Em prol da Terceira Idade, criamos desde programas de Medicina Preventiva até o Promeg (Programa de Medicamento Gratuito), passando por consultas médicas domiciliares. 

Também implantamos o Cartão Conforto permitindo aos maiores de 60 anos de idade usarem o mesmo acesso que os outros passageiros e terem o direito de sentar-se em qualquer lugar do ônibus. Antes, apesar da gratuidade, tinham de ficar confinados em um pequeno espaço próximo ao motorista. 

Instalamos ainda o Conselho Municipal do Idoso e Centros de Referência para assistência dirigida, além de ampliarmos o repasse de verbas a instituições que atendem este público. Proporcionamos também cursos, oficinas culturais nos bairros e núcleos de ginástica especializada, entre outros benefícios, além de garantir isenção de IPTU para idosos e aposentados de baixa renda.

No rol das ações dirigidas à Terceira Idade, destaco a implantação do inédito Pró-Hiper, focado em cuidar da saúde física e mental, além da sociabilidade, de quem tem mais de 60 anos. Reúne atividades de recreação, sala de ginástica com modernos equipamentos, piscinas aquecidas, saunas, vestiário, quiosques e laboratório de informática, dotado de computadores com acesso à internet. 

O laboratório de informática visa garantir ao idoso a chance de interagir com novas ferramentas do mundo moderno, estar apto a acompanhar a evolução e não acabar marginalizado. O atual governo também tem se esforçado para melhorar o atendimento ao idoso. Destaco as ATIs (Academias da Terceira Idade), com aparelhagem destinada à prática de atividades físicas em espaços públicos. Contudo, as prefeituras são os entes mais penalizados com a queda de repasses da União e dos estados. As baixas financeiras acabam prejudicando ações importantes, como serviços de manutenção e a abrangência de programas sociais.

A sociedade não absorveu a inversão etária. Mais uma mostra cabal vem do mapeamento de consumo feito pelo SPC (Serviço de Proteção ao Crédito), em setembro último. De cada 100 idosos, 45 dizem não encontrar produtos e serviços adequados a sua faixa etária. Como exemplo, está a inexistência de aparelho celular com letras e teclados maiores que facilitem a visão. No vestuário, faltam opções intermediárias entre os modelos para jovens e para “avozinhos” demais.
"Governantes e a própria sociedade precisam correr
contra o tempo para se ajustar à realidade que se avizinha."

Governantes e a própria sociedade precisam correr contra o tempo para se ajustar à realidade que se avizinha. Envelhecer é inevitável. As limitações físicas e mentais também são. Cuidar do idoso não significa tolhê-lo de sua individualidade e autonomia nem fazê-lo crer que deixou de ser útil, porque isto seria ferir de morte sua autoestima. 

Apesar dos meus 74 anos, asseguro que não estou advogando em causa própria. Sempre fui intransigente no zelo aos princípios de nunca abrir mão do dever de conceder à Terceira Idade o que ela merece: respeito, gratidão, reconhecimento, amizade, atenção e amor, muito amor. 

Junji Abe é líder rural, foi deputado federal pelo PSD-SP (fev/2011-jan/2015) e prefeito de Mogi das Cruzes (2001-2008)


Crédito da foto: Arquivo/Alexssandro Loyola