sexta-feira, 7 de maio de 2010

Todas as Igrejas são de Deus

O ser humano vive em constante transformação. De forma imprevisível e irresponsável, acaba imputando vastos prejuízos à natureza, assim como deploráveis mutações ao próprio habitat. Não sou sociólogo, psiquiatra, ideólogo e, muito menos, guiado por alguma pretensão maior. Sequer, detenho conhecimentos mínimos sobre o campo da espiritualidade ou do mundo religioso. Porém, com muita humildade e respeito, vou me permitir discorrer sobre a necessária e importante religiosidade que cada um tem de cultivar e abraçar para o conforto espiritual, sempre com fé inquebrantável em Deus. É deste exercício permanente que nascem os sentimentos de solidariedade, de amizade e de amor ao próximo.

Convenço-me, cada vez mais, da grande missão que deve, espontaneamente, brotar da alma para rechaçar o preconceito, a discriminação e outros desprezíveis pensamentos similares. E, desta maneira, admitir, respeitar e valorizar a diversidade entre pessoas e povos, aceitando-a com naturalidade. Mais que isso. Entendendo que Deus fez assim, por absoluta necessidade de o ser humano viver em sociedade, de depender um do outro, porque como resume a famosa citação de autoria desconhecida, “somos anjos de uma asa só, precisamos nos abraçar para alçar vôo”.

Constata-se na história que, desde quando mundo é mundo, a sede desmedida pelo poder – prima-irmã da possessividade, egocentrismo, vaidades fúteis e outros sentimentos indignos –, associada à pseudo-inteligência ou ilusão de sabedoria, tem deflagrado sucessivos desentendimentos na humanidade. Os conflitos surgem de atos e fatos banais, insignificantes, sem nexo, pequeninos mesmo, como a divergência de opiniões sobre a cor de um vestido, preferências diferentes por times de futebol, uma mínima falha cometida no trânsito ou o latido de um cão no vizinho. Nutridas por mágoa, ressentimento, inveja, ciúme, raiva, ódio e afins, as discórdias ganham proporções descabidas e resultam em ações inimagináveis, porém, concretas, de violência. Basta dizer de crianças, inclusive bebês, assassinadas friamente pelos próprios pais, de explosivos detonando milhares de vidas durante atentados terroristas, da proliferação de gente-bomba (homens e mulheres) com a missão morrer para matar e do derramamento de sangue nas guerras, entre tantas outras mostras de horror.

Nada justifica a violência. De xingamentos a confrontos físicos, chegando ao extremo das guerras, tudo isto é abominável. Mais execrável ainda é que inúmeros crimes sejam praticados por seres deste Planeta Terra em nome de diferentes credos e religiões. Pior, sejam incitados e planejados por uma escória que se julga líder espiritual e supremo exemplo de devoção.


As guerras religiosas dominaram o cenário mundial desde a Idade Média. A mais célebre foram As Cruzadas (nove, segundo a tradição) – cerca de dois séculos de batalhas entre cristãos e muçulmanos, que deixaram milhões de mortos e um rastro de destruição. No século XVI, conflitos entre católicos e protestantes devastaram a França e se alastraram por toda Europa. São amostras dos infindáveis registros de combates motivados por preferências religiosas. As tropas irrompiam da sociedade. Nunca faltaram pessoas para acreditar nas aberrações usadas como justificativas às ambições econômicas e geopolíticas dos agressivos grupos no poder em vários pontos do mundo.

Essas atrocidades ultrapassam nossa capacidade de entendimento. São fatos inexplicáveis. Torturar, saquear, estuprar, matar em nome de Deus? Não. Deus é um péssimo argumento para a sucessão de agressões insanas carreadas por fundamentalismos religiosos.

O mais alarmante é que os desentendimentos não se esgotaram nos dias atuais. Ao contrario, dão sinais de recrudescimento em várias partes do mundo. Inclusive, entre povos do mesmo país. Lamentavelmente, a concorrência entre grupos religiosos ainda é visível e palpável. Em meu modesto entendimento, ancoram-se em obsessão por poder, ganância, demonstração de força ou coisa que o valha.

Como exemplo, vou pinçar Mogi das Cruzes – já que fatos similares se repetem em todos os quadrantes do Brasil e do mundo; evidentemente, com maior ou menor intensidade. Em 2001, quando, honrosamente, começei a administrar o Município, fui procurado por inúmeros pastores de Igrejas Evangélicas. Denunciavam que recebiam tratamento desigual em relação às Igrejas Católicas, apesar de todas serem cristãs. Referiam-se à fiscalização da Lei do Silêncio, concessões na cobrança do IPTU – Imposto Predial e Territorial Urbano e a falta de perspectiva de apoio municipal ao, então, projeto “Marcha para Jesus”, entre outras situações interpretadas como discriminatórias pelas lideranças evangélicas.

Pois bem, os parâmetros de Justiça foram restabelecidos. Havia, sim, atitudes preconceituosas por parte de alguns fiscais da Lei do Silêncio. A legislação municipal estabelece critérios, em limites de decibéis, para o nível de ruídos e barulhos detectados na celebração de cultos em templos, igrejas e áreas públicas abertas – alvo das maiores reclamações. Com relação ao IPTU, por meio de disposições legais, praticamente todas as igrejas evangélicas receberam isenção tributária.


Os católicos mogianos costumam dizer que a parte festiva da Festa do Divino Espírito Santo de Mogi das Cruzes ganhou dimensão fantástica somente após 2001 quando, à frente da Administração, assumi a responsabilidade pelo apoio logístico integral ao evento. Bispos, padres e líderes católicos relatam que esse crescimento alavancou, valorizou e ampliou significativamente o número de fiéis, na acepção da palavra. Aliás, modéstia à parte, a contribuição foi além, com a instalação do Sub-Império do Divino na sede da Prefeitura.

Vale ressaltar que cheguei à Administração Municipal com o firme propósito de ter a efetiva e permanente participação e parceria dos seguidores de todas as religiões. E a gestão foi recompensada, visto que as políticas públicas nas diferentes áreas tiveram êxito.


Assim, legítimo e mais do que justo que a Prefeitura oferecesse igual apoio às Igrejas Evangélicas para realização da “Marcha para Jesus”. O primeiro grande evento ocorreu em 2002 e, graças a Deus, a cada ano que passa, mais fiéis e devotos registram participação.

Sou cristão, sou católico, mas confesso que deixo muito a desejar como verdadeiro praticante da minha religião. Entretanto, tenho fé inquebrantável em Deus e faço tudo com amor e desprendimento. Na verdade, me julgo premiado por Ele. Tenho obtido tudo o que poderia esperar da vida – família unida, saúde, amigos, paz de espírito, muito amor para dar, enfim, sou uma pessoa feliz e super agradecida.

Mesmo católico, jamais esquecerei os fabulosos ensinamentos conceituais, filosóficos e de princípios do Budismo. Foi a religião dos meus avós, imigrantes japoneses que, em grande parte, moldaram minha alma e me possibilitam cumprir os desafios da missão de ser um cidadão brasileiro.

Cresci com o budismo, aderi ao catolicismo e, no cotidiano, aprendo muito com evangélicos, espíritas e seguidores de outros credos sobre o imprescindível valor da religião em nossa vida. E, assim, ganho mais força para lutar sempre pelo respeito à diversidade em todos os sentidos e pela valorização das divinas diferenças entre os seres humanos. Afinal, estas são as regras sabiamente criadas pelo Senhor.

Em razão de todos esses fatos, não posso compactuar com preconceitos e discriminações que geram discórdias de impensáveis proporções na humanidade. Defensor irrestrito do papel indispensável da religião na vida do ser humano, sou integralmente contra a desnecessária, ilegítima, inoportuna e tão prejudicial concorrência entre as igrejas de credos diferentes.
Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

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