sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Jeito natural de nascer

Vejo com tristeza o ávido crescimento da taxa de cesarianas no mundo. Na contramão das recomendações do Poder Público e de instituições representativas da classe médica, cada vez mais mulheres buscam o parto cirúrgico em vez do método natural. Há argumentos dos mais variados. Um deles remete à maciça participação feminina no mercado de trabalho com o ilusório conceito de que a cirurgia exigiria da parturiente menor tempo de repouso. Outros estão associados ao incentivo de muitos médicos que alardeiam vantagens como ausência de dor, menor sofrimento e o planejamento do parto, com dia e hora marcados.

Recente estudo divulgado pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) mostra que a taxa de cesarianas subiu na rede privada brasileira. Atingiu 84,5% no ano passado contra os 79% registrados em 2004. Já no setor público, a média nacional gira em torno de 31%. No Estado de São Paulo não é diferente. Em todas as regiões paulistas, a proporção de partos cesarianos supera – e muito – o máximo de 15% recomendados pela Organização Mundial de Saúde.

Não sou médico. Mas, como gestor público que fui quando comandei a Prefeitura de Mogi das Cruzes – Região Metropolitana de São Paulo, o nível de atenção à saúde da mulher foi um dos pontos que mais me chamou a atenção. Durante as reuniões do Plano de Governo Participativo – elaborado em conjunto com a população – ouvimos depoimentos chocantes, como o de Maria: 27 anos, seis filhos, o sétimo a caminho e nunca fizera exame de prevenção do colo do útero. A filha mais velha, de 14 anos, entrara no quinto mês de gestação sem ter passado por um único exame pré-natal.

Por quê? Nas palavras de Maria, confirmadas por outras centenas de mulheres, uma consulta com ginecologista parecia quase tão difícil quanto enfrentar as dores do parto. E se a criança já não tinha assistência no ventre da mãe, também não receberia cuidados adequados depois de nascer. Não por menos, a cada mil bebês que nasciam com vida, 44 morriam antes de completar o 1º ano. Esta era a realidade em 1999. Bem mais que dados afrontando as políticas vigentes na área da saúde, a morte dessas crianças torturava famílias, frustrava sonhos e violentava a dignidade do ser humano, transformando nascer e viver numa missão de alto risco. A mulher – gestante, lactente, mãe –, sofria as agruras de quem está no centro do redemoinho, à mercê da sorte.

Assumimos a Prefeitura em 2001 com uma filosofia de governo alicerçada na qualidade de vida dos moradores. Significa que o ser humano vem em primeiro lugar. É nele que está o foco. Tudo mais tem de ser ajustado a esse propósito. Fique claro que os cuidados começam quando ele ainda está na barriga da mãe. E se estendem ao longo de sua existência. São conceitos de prática obrigatória em todas as áreas da Administração Municipal.


Desinformação da população, precariedade do saneamento básico, inexistência ou baixa oferta de exames de diagnóstico e deficiências estruturais da rede municipal de saúde – escassez de profissionais e de equipamentos – emergiam como os principais fatores a serem atacados. Essas falhas do sistema municipal de saúde vitimavam, principalmente, a mulher. É ela quem vive o drama da gravidez não ou mal assistida. É ela quem assume a maior e mais importante parcela de responsabilidade pela criação dos filhos. É ela quem orienta e monitora as ações cotidianas em casa. É ela o agente da formação e transformação de hábitos.

Esses e outros motivos tornaram cristalino o fato de que qualquer avanço em saúde depende da qualidade do atendimento à mulher. Daí, o motivo da revolução levada adiante pela Prefeitura. Reorganizamos a rede municipal, otimizamos recursos existentes, ampliamos e aperfeiçoamos o atendimento, a frota de ambulâncias e, em especial, o time de profissionais. Por exemplo, em pouco mais de um ano, o número de ginecologistas subiu de 16 para 40; e o de pediatras, de 28 para mais de 60.

O pacote de medidas incluiu o reforço dos programas de vacinação, a instalação do Laboratório Municipal de Análises Clínicas e sete unidades do Programa Saúde da Família. Não bastasse, desenvolvemos um novo conceito de assistência à população feminina, materializado na operação do Pró-Mulher. Junto com ele, veio uma bateria de benefícios. Desde a completa assistência Pré-Natal até programas dirigidos à gestação de alto risco, passando pelo combate às carências nutricionais planejamento familiar para evitar a gravidez precoce e saúde bucal para gestantes e bebês. Ao mesmo tempo, instalamos o Comitê de Investigação de Óbito Materno-Infantil.


Investimos mais. Lançamos a segunda unidade do Pró-Mulher, implantamos o Pró-Parto, o Promeg (distribuição gratuita de medicamentos), o Pró-Criança e o Programa Saúde na Comunidade – que leva um mutirão de serviços aos bairros onde não há unidades de saúde –, entre dezenas de outros.

O município também assumiu as ações básicas de Vigilância em Saúde, com destaque para os trabalhos de orientação e campanhas de prevenção. Em 2006, Mogi ganhou um Centro de Controle de Zoonoses, dotado de tecnologia de ponta e classificado como um dos mais modernos do País. A estrutura permitiu, por exemplo, a inédita campanha de esterilização gratuita de cães e gatos, além da vacinação em massa. Até 2000, sequer tinha veterinários na rede.


É bom citar que reativamos a produção conjunta entre as três esferas de governo que movimentam as engrenagens da saúde pública. O Estado concluiu a ampliação do Hospital Luzia de Pinho Melo. Já o trabalho integrado entre governos e sociedade viabilizou o processo de recuperação da Santa Casa. Quanto maior a sinergia entre esses parceiros, melhor a produtividade e maiores os dividendos da população.

Mortalidade infantil cai 47%

O conjunto de ações repercutiu sobre as taxas de mortalidade materna e infantil. Em 2002, o indicador já havia caído de assombrosos 21,5, do ano 2000, para 17,3 por mil nascidos vivos. Em 2005, ficou em 12,9 mortes a cada mil nascimentos. Pela primeira vez na história, o município teve menos mortes de bebês que a média registrada no Estado (13,5). Dados da Fundação Seade mostram queda de 47% nos últimos nove anos. O ano de 2008 terminou com 11,3 mortes, índice que pode ser comparado aos de países do Primeiro Mundo. É lógico que ainda não estamos satisfeitos. Todos os esforços perseguem o ideal de zerar a mortalidade infantil e materna.

Ao mesmo tempo, cresceu o número de gestantes adeptas do parto normal em relação àquelas que recorrem à cesariana. Agora, nossas expectativas se voltam para a continuidade das ações que revolucionaram o jeito de lidar com a saúde do povo. E que dão bons frutos. É preciso manter ativos as campanhas de conscientização e os esforços coletivos para reduzir a taxa de cesarianas no Brasil. A meta é que cada vez mais mulheres optem pelo método natural. E tenham toda assistência para sustentar esta escolha. Tanto no sistema público quanto na rede privada.
Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Além das comemorações

Passada a comoção das festividades do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil, entram em foco os desdobramentos da relação bilateral entre os dois países. Brasileiros e japoneses têm pela frente o desafio de transformar a irmandade instalada há 100 anos em conexão permanente para o desenvolvimento mútuo nos diversos campos do conhecimento.

Esse foi o cerne do Simpósio de Avaliação do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil, promovido pela Fundação Japão. Foram dois dias de atividades divididas em oito grupos de trabalho para abordar, com a participação de debatedores ilustres, as múltiplas faces da imigração japonesa, seus reflexos na sociedade brasileira, os resultados da integração entre os dois povos e as perspectivas para o futuro.

“Toda vez que você beber água de um poço, precisa fazer uma profunda reflexão no sentido de agradecer todas as pessoas que trabalharam para construí-lo”. Com esta frase, traduzida de um poema japonês, o diretor da Fundação Japão, Jo Takahashi, enfatizou a importância do sentimento de gratidão no contexto. Os agradecimentos estendem-se a todos que trabalharam anonimamente para o êxito das ações dos imigrantes, assim como para a evolução da relação bilateral Brasil-Japão.

Este sentimento de gratidão é muito forte em mim. Desde criança, ouvia dos meus avós e pais, imigrantes japoneses, que era preciso “amar este País, de todo coração, ajudar o povo em tudo o que for possível e fazer mais pelo Brasil que os próprios brasileiros”.

Mais do que palavras na mente da criança que fui, são princípios gravados na alma do homem que sou. Traduzem gratidão à Nação que acolheu a nossa e tantas famílias vindas do outro lado do mundo. Demonstram o afeto por esta gente alegre, hospitaleira e carinhosa que passou por cima de todas as diferenças, não viu barreiras culturais e nem de idioma para interagir e estabelecer os laços que se consolidaram sob a linguagem universal da emoção.

A coincidência do último ano da nossa administração à frente da Prefeitura de Mogi das Cruzes com a data histórica do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil nos levou a buscar algo que resgatasse a lembrança da epopéia de dificuldades, sofrimento e de mil obstáculos superados. E que mantivesse aceso nos descendentes o dever e o prazer da gratidão ao povo brasileiro. Mas também desse, a todos nós, brasileiros, a chance de reafirmar a admiração e o reconhecimento aos batalhadores do País do Sol Nascente. Ao mesmo tempo, que nos permitisse agradecê-los pelo tanto que fizeram pelo desenvolvimento da nossa Pátria. E por semearem a credibilidade, organização, solidariedade, disciplina, seriedade, amor ao trabalho e outros valores tão nobres.

Tinha de ser algo que propiciasse, por no mínimo mais 100 anos, o contínuo fortalecimento da relação bilateral entre Brasil e Japão. E que fomentasse o vigoroso intercâmbio tecnológico, ambiental, econômico-financeiro, cultural e tantos outros, avançando, além do tempo, o aprendizado mútuo inaugurado com o convívio entre os dois povos.

Mas, não era só. Tinha de ser algo que retribuísse, pelo menos um pouco da confiança e da amizade ofertadas pelos brasileiros. Em especial, pelos mogianos. Tinha de ser algo grandioso como a ligação entre os dois povos. E vivo, capaz de evoluir, transformar e de ser transformado.

Assim, surgiu o Parque Centenário. Erguido sobre uma área degradada onde só havia crateras herdadas da intensa exploração mineral, às margens do vital e lendário Tietê que, solitário e calado, chorava a devastação. Seguindo a lição dos imigrantes que coloriram nossas terras com a produção agrícola, recuperamos o espaço de 215 mil metros quadrados. Centenas de cerejeiras – símbolo do Japão – compartilham espaço com os nacionais ipês, paus-Brasil e quaresmeiras, avivando a paisagem em perfeita sintonia. Tal qual o relacionamento entre japoneses e brasileiros.

Agregando valor cultural, destacam-se equipamentos e atrações, como o Memorial da Imigração, Memorial do Parque, Memorial de Seki e Toyama – cidades-irmãs de Mogi –, Espaço Bom Odori e Samba, Ilha do Torii, balsa, pontes flutuantes, chafariz, ponte em arco, playground, mini-campo de futebol, quadra de vôlei, chalés, churrasqueiras, uma fantástica réplica do Navio Kasato Maru e o Pavilhão das Bandeiras unindo os estados brasileiros às províncias japonesas.

É um espaço que revigora os ânimos exibindo a prova de que nenhuma adversidade é intransponível. É branco, amarelo, preto, vermelho, de todas as cores, furta-cor. Está acima das raças e crenças. É multicultural. Também faz um chamado à necessidade de sonhar sempre. E de trabalhar para realizar cada sonho. É ainda um tributo à fé na humanidade, à grandeza dos sentimentos, ao valor da amizade.

O Parque Centenário materializa a reciprocidade de sentimentos. Homenageia japoneses e descendentes com a memória da imigração e a reprodução de ícones da arquitetura nipônica. Homenageia os mogianos com um espaço público para o lazer, atividades culturais e, principalmente, para incentivar o convívio familiar.

Os ricos debates que se processaram ao longo do Simpósio renovaram minha convicção de que o Parque Centenário abriga os conceitos fundamentais definidos para homenagear, em mão dupla, os 100 anos da Imigração Japonesa no Brasil.

Isto, porque não termina com as festividades. Ao contrário, abre contínuos horizontes de possibilidades. E faz ecoar, de Mogi para o mundo, o genuíno exemplo de intercâmbio plural, cooperação mútua, coexistência pacífica e verdadeira amizade entre Brasil e Japão. Foi assim há um século. É assim hoje. Será ainda mais amanhã. Em especial, porque nutro a fé de que, com a luz divina, havemos de ter êxito na perseguição dos objetivos primordiais de toda a humanidade – igualdade, com respeito à diversidade, justiça social, qualidade de vida e paz. Afinal, já temos um bom começo.


Junji Abe (DEM) é ex-prefeito municipal de Mogi das Cruzes

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Certeza na mente e pés no chão

Não sou engenheiro ambiental nem biólogo ou tampouco especialista em gestão de recursos sólidos. Sou, acima de tudo, um ser humano, em pleno exercício da cidadania, que preza o direito de viver, respeita a biodiversidade e tem a convicção de agir, com todas as forças, para evitar o extermínio da qualidade de vida do cotidiano das gerações futuras no planeta.

Como tal, me sinto no dever de rechaçar, veementemente, a ideia de implantação de um novo aterro sanitário. Seja em Mogi das Cruzes ou qualquer outra região. E tanto faz que seja um empreendimento da Queiroz Galvão, do Zé ou do Mané. O fato imutável é que enterrar lixo é um sistema arcaico, extremamente danoso ao meio ambiente e um inimigo voraz da qualidade de vida. Não adianta dizer que este ou aquele modelo de aterro é adequado, porque cumpre as normas de órgãos governamentais. Isto não existe.

Para se ter noção da herança maldita de um aterro, basta citar que, esgotada a vida útil do empreendimento, é necessário desenvolver um Plano de Recuperação Ambiental (PRAD) para a área, invariavelmente gigantesca. E pasmem: o local não pode ser aproveitado para absolutamente nada por 40 anos. É o sepultamento do que foi enterrado.

Falar em aterro sanitário moderno é o supra-sumo da contradição. É tão incoerente quanto mesquinho no mundo globalizado, onde a informação trafega sem fronteiras. Já se vão mais de três décadas que outros países utilizam alternativas ambientalmente adequadas e viáveis sob o aspecto econômico.

Das tecnologias empregadas, a mais comum é a incineração dos descartes que não podem ser reciclados. É uma etapa antecedida por coleta seletiva e triagem. Em países como o Brasil, onde há produção agrícola em larga escala, é possível aproveitar a riqueza do lixo e reduzir o volume de detritos a ser incinerado. Basta submeter os resíduos orgânicos à usina de compostagem, que gera corretivo de solo e adubo para as lavouras (veja detalhes na postagem “A gestão do lixo”, de 06/10/09).

A Região do Alto Tietê – que engloba dez municípios – vive uma situação crítica para destinação final do lixo. Dos aterros licenciados, um foi interditado e o outro terá sua capacidade esgotada em curto espaço de tempo. Em reunião para tratar do assunto, os prefeitos ouviram do secretário de Estado do Meio Ambiente, Xico Graziano, a abominável afirmação de que a melhor solução para o problema é a implantação de um aterro sanitário regional. E devolveu a batata quente aos governantes municipais, que saíram da Secretaria com a incumbência de estudar áreas para acomodar o malfadado empreendimento.

Ora, poupem-nos, todos, dos contornos surreais do caso. Não faz nem três anos que Mogi das Cruzes, a duras penas, derrotou o espectro de virar sede do aterro projetado pela Construtora Queiroz Galvão. A repulsiva ideia, então, arquivada corre o risco de retornar à pauta de análises dos órgãos ambientais. De carona no drama da destinação do lixo, a empresa já havia pedido a reabertura do processo de licenciamento. Agora, somou a seu favor a manifestação do secretário.

O escabroso plano da empresa é instalar um aterro no Distrito Industrial do Taboão, em Mogi – o maior e único espaço disponível na Região Metropolitana para expansão empresarial. São mais de 12 milhões de metros quadrados, o bastante para abrigar 80 empresas, empregar 45 mil pessoas e injetar nos cofres públicos cifra anual de R$ 40 milhões referentes a impostos. Autorizar a instalação de um aterro sanitário regional na área seria macular esse horizonte com uma cortina de repulsa a outros investimentos. E pior: mutilar a perspectiva de desenvolvimento da Cidade e de ascensão da qualidade de vida do povo mogiano.

A importância do Taboão no contexto sócio-econômico não se cinge ao território mogiano. É lá que também está a possibilidade de empregos e geração de renda para habitantes de cidades vizinhas, como Biritiba Mirim e Salesópolis, onde severas restrições ambientais impedem a instalação de empresas e o consequente aumento do nível de empregabilidade.

Por todos estes motivos, a sociedade não pode ficar silente nem passiva. O que está em jogo é a vida, projetada no ambiente que deixaremos para nossos filhos e netos. Em Mogi, já foi resgatado o Movimento “Aterro Não!”, do qual faço parte, com muito orgulho e uma determinação maior ainda: vamos provar às autoridades que existe solução viável para destinar os rejeitos domiciliares sem massacrar o meio ambiente. E exigir que a Cidade e a Região tenham a atenção de direito dos governos estadual e federal.


Os integrantes do Movimento trabalham intensamente para realizar o Fórum com o objetivo de apresentar sistemas alternativos para o tratamento de lixo, envolvendo toda a sociedade no debate. Embora muitos se espantem, a adequada destinação do lixo tem a mesma importância do recolhimento e tratamento dos esgotos domésticos. Em ambos os casos, os procedimentos corretos significam preservação ambiental e melhoria da saúde pública.

Também não há que se dizer que os custos inviabilizam sistemas alternativos aos aterros. Há empresas que se propõem a efetivar empreendimentos a custo zero para os cofres públicos. E mesmo que seja necessário bancar o investimento, os resultados são compensadores. Ou alguém acha que é caro demais garantir a qualidade de vida das gerações futuras?

Precisamos conhecer tecnologias apropriadas à gestão dos resíduos domiciliares, sob os aspectos de prudência ambiental, viabilidade econômica e ganho social, para selecionar o projeto que melhor atende às necessidades da região. A partir daí, lutar pela sua execução, convencendo as autoridades a responderem com eficiência e sensatez o justo clamor popular.

Portanto, faço um apelo a cada cidadão mogiano: venha participar do fórum, engrossar o coro do Movimento, levantar a voz contra o aterro e gritar pela adoção de um sistema adequado de destinação dos resíduos domiciliares. Estendo o pleito a todos os moradores do Alto Tietê porque está claro que a solução para o problema do lixo tem de ser regional. E, acima de tudo, coerente. Até porque a Região é pólo produtor de água para a Grande São Paulo e conserva significativas porções de Mata Atlântica.

Entendo que não basta livrar Mogi das Cruzes do aterro sanitário. É preciso extinguir a prática de enterrar os descartes domésticos, dando ao lixo os mecanismos da imprescindível transformação para assegurar o ciclo da vida. Já temos a certeza na mente e os pés no chão. Agora, precisamos nos manter unidos e fortes para fazer valer nossa vontade, resguardando nosso direito ao desenvolvimento sustentável, com qualidade de vida.

Junji Abe (DEM) é ex-prefeito municipal de Mogi das Cruzes

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Migalhas de reforma eleitoral

É evidente que as intervenções pontuais realizadas na minirreforma política e eleitoral ainda estão muito distantes da imprescindível reforma, modelada com justiça e eficiência. Do que se fez, entendo que a liberação do uso da internet foi positiva. Não fazia sentido caminhar na contramão da atualidade, impondo restrições à utilização da rede mundial ou equiparando a ferramenta a veículos de comunicação como rádio e TV.

Fato é que, enquanto não houver coragem para efetivar uma profunda e irrestrita reforma política e eleitoral, capaz de atender as necessidades do País e da população, as intervenções pontuais não passarão de remendos. É como criar um Frankenstein, a partir de restrições que, de tão incoerentes, acabarão tirando do povo o direito de conhecer, analisar e escolher os candidatos.

Não há que se falar em igualdade de condições sem que haja a mesma possibilidade de exposição a todos os concorrentes. Ocorre que isto não se dará enquanto perdurarem graves distorções no sistema político-eleitoral. Começa pelo excesso de partidos políticos. Entendo que não deveria haver mais de seis, de forma que todos se apresentassem fortalecidos, sustentando as respectivas ideologias e exercendo real poder de decisão. Assim, sólidas, as agremiações seriam o porto seguro da democracia, o melhor regime existente.

Em outras palavras, a legenda responderia pelos candidatos, neutralizando o personalismo em benefício do partido. Isto também viabilizaria o trabalho imparcial da Imprensa e resgataria a governabilidade porque o detentor do mandato, eleito, não seria o agente de negociações com quem quer que fosse. Tudo ficaria a cargo do partido. Somado a isso, vale frisar que sou adepto incondicional do voto distrital.

A política é a arte de praticar o bem comum. Porém, a atuação irresponsável de determinados políticos joga toda a classe política na vala comum do descrédito, esfacelando o único elemento que une homem público e população: a confiabilidade. É uma sintética exposição da minha opinião, considerando a multiplicidade de transformações de que o sistema necessita para cumprir sua função social. Resumindo, chega de remendar a legislação com maquiagem chula. Já passa da hora de executar a verdadeira reforma político-eleitoral.


Junji Abe (DEM) é ex-prefeito municipal de Mogi das Cruzes

terça-feira, 6 de outubro de 2009

A gestão do lixo

De fato, é nosso dever cuidar da adequada destinação final do lixo para garantir o bem-estar das gerações futuras. O primeiro projeto de Lei que apresentei como deputado estadual, logo que fui empossado no cargo em 1991, previa a criação de consórcios para instalação de usinas de compostagem.

Como cidadão, reafirmo total contrariedade ao modelo obsoleto de enterrar lixo. Enquanto prefeito de Mogi das Cruzes, recusei a cessão de uma área escolhida pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente. Explico: o que se pretendia fazer era utilizar a verba federal do PNMA II (Programa Nacional do Meio Ambiente) na instalação de um aterro sanitário regional – para receber detritos de todo o Alto Tietê – ao lado do Lixão da Volta Fria, aquele que, com muito esforço, tínhamos conseguido desativar.

Justificando nossa repulsa à malfadada ideia, mostramos ao representante do Estado no PNMA II, Martinus Filet, o conceito do tratamento que consideramos viável para a questão, em nível regional. Consiste na prática eficiente da coleta seletiva, operação de centrais de triagem, implantação de usinas de compostagem – três bastariam para a Região – e, posteriormente, a instalação da usina de incineração (a chamada Usina Verde).

Aí, sim, Mogi estaria pronta para ceder área, começando por abrigar uma usina de compostagem. É nesta direção que trabalhamos após a desativação do Lixão da Volta Fria.

A usina verde tem custo estimado em cerca de R$ 300 milhões. Já a usina de compostagem, que transforma resíduos sólidos em adubo orgânico, demanda bem menos – algo em torno de R$ 2 milhões. Aliás, era este investimento que pretendíamos fazer na área vizinha ao antigo Vazadouro da Volta Fria. A simples operação de uma unidade de compostagem aumentaria muito a vida útil dos aterros sanitários e, por fim, a usina verde sepultaria a existência deles.

A efetivação do projeto em duas etapas leva em conta as dimensões continentais do Brasil, a agricultura pujante como consumidora de adubo orgânico, as necessidades da população, valores dos investimentos e o prazo para revisar a legislação vigente incluindo diretrizes à operação de novas tecnologias na gestão de resíduos sólidos.


Vou dar números. Se, atualmente, a Região produz entre 500 e 600 toneladas diárias de lixo, com os processos de coleta seletiva, reciclagem e compostagem, o volume cairia aproximadamente 70% - baixando para cerca de 120 toneladas por dia. Seria esta carga – equivalente a 30% do total gerado – que iria para a usina de incineração (verde), produzindo energia elétrica. Ao final, restariam menos de oito toneladas (perto de 6%) de cinzas, devidamente transformados em fertilizantes e componentes de materiais para construção civil, como asfalto e concreto.

Para preparar o estudo, nos municiamos das mais privilegiadas fontes. Já em 2006, eu e demais representantes das cidades integrantes da Amat (Associação dos Municípios do Alto Tietê), visitamos a Universidade Federal do Rio de Janeiro para conhecer o protótipo da usina de incineração – a única do País – que opera com capacidade minúscula – seis toneladas de resíduos por dia. Só Mogi produz cerca de 250 toneladas.

Em 2007, visitei três das 17 usinas de incineração existentes na cidade de Nagoya, no Japão. Do total de lixo domiciliar gerado, 30% são reciclados por conta da adesão popular à coleta seletiva. Os 70% restantes seguem para as usinas. A maior parcela vira energia, aproveitada nas áreas urbanas do entorno. Sobram de 5% a 6% do volume total, transformados em fertilizantes e componentes para construção civil.

Todos estes fatos e nosso parecer estão devidamente registrados nas atas das reuniões da Amat. A maioria foi noticiada pela Imprensa. A primeira sinalização positiva da Secretaria do Meio Ambiente à proposta das usinas de compostagem veio no final de 2007, com a informação de que o Estado faria os projetos executivos das unidades, o que possibilitaria aos municípios se organizarem em consórcios. Ocorre que o plano não avançou porque, em 2008, tudo ficou suspenso em função das restrições impostas pela Lei Eleitoral.

No final de 2008, em nova reunião com Martinus Filet, soubemos que o projeto da usina verde não poderia ser desenvolvido em menos de quatro anos porque a questão da emissão de gases e outros aspectos relacionados ao empreendimento ainda não estavam regulamentados.

Apesar das eleições municipais, não há necessidade de começar o processo da estaca zero. Não só a Prefeitura de Mogi como a Amat tem elementos suficientes para buscar esta conquista: melhorar a coleta seletiva, viabilizar a reciclagem, implantar usinas de compostagem e, posteriormente, instalar a usina de incineração (verde). No mais, estou à disposição para participar de um debate público sobre o tema e contribuir tanto quanto possível na solução do problema.

Junji Abe (DEM) é ex-prefeito municipal de Mogi das Cruzes

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Releitura de 15 anos do Plano Real

É preciso trazer à luz os fatos que caracterizaram o cenário nacional ao longo de quase duas décadas, entre o início dos anos 70 e o lançamento do Plano Real, em 1994.

Os primeiros sinais de inflação foram detectados em 1975 e se transformaram numa escalada inflacionária crescente ao longo dos anos seguintes. Tanto, que houve uma sequência de planos emergenciais para estabilização da moeda – Cruzado, Verão, Bresser, Collor e outros. Todos naufragaram.

O Brasil vivia uma situação caótica com índices inflacionários que atingiam 90% ao mês. As classes produtivas e trabalhadora foram as mais sacrificadas. A proliferação da desigualdade social se deu em proporções nunca vistas na história do País. Quem produzia e trabalhava, só perdia dinheiro. Quem aplicava no mercado financeiro – os poucos abastados – , só ganhava dinheiro.

Foi o tempo da ciranda financeira com concentração de renda nas mãos de poucos privilegiados e a acelerada deterioração da qualidade de vida do povo. As remarcações de preços ocorriam diversas vezes num período de 24 horas. O salário recebido num dia perdia cerca de 20% do poder de compra nas 48 horas seguintes.

As contínuas quedas de padrão sócio-econômico davam a tônica da situação. Aqueles que se enquadravam na classe B, caíam para C ou D e, assim, sucessivamente, levando para as favelas ocupantes de habitações de nível médio e para debaixo das pontes quem já vivia em submoradias. Paralelamente, o governo não dispunha de recursos para investimentos em setores básicos, sepultando a qualidade de serviços públicos. O País chegou a ter 40 milhões de brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza. Muitos fizeram o caminho inverso de seus antecessores – os imigrantes –, buscando sustento em países europeus, nos Estados Unidos e Japão.

Foi este o cenário encontrado pelo, então, senador Fernando Henrique Cardoso que, a convite do presidente Itamar Franco, assumiu o Ministério da Fazenda. Do trabalho dele e de uma equipe plural de economistas, nasceu o Plano Real, o único extremamente consistente e que não naufragou na meta de estabilização da moeda nacional.

Ao longo da sua existência, o Plano Real passou por uma série de ajustes para associar a manutenção da moeda forte à necessidade de adequação à globalização da economia e a consequente concorrência internacional.

Fato é que o alcance das metas do Plano Real está umbilicalmente ligado ao desempenho de Fernando Henrique em seus mandatos na Presidência da República. Foi na gestão dele que surgiu um instrumento essencial ao suporte das ações para estabilização econômica: a Lei de Responsabilidade Fiscal, que colocou os governos – nas três esferas de Poder – sob austera vigilância para o cumprimento do equilíbrio orçamentário fiscal e financeiro.

Estas ações efetivas resgataram o Brasil do fundo do poço. Os setores produtivos evoluíram e, junto com eles, a oferta de emprego e a riqueza. A desigualdade social começou a diminuir e a classe média voltou a ter representatividade na composição da pirâmide social. Os avanços estão explícitos no cotidiano dos brasileiros que passaram a ter condições de acesso a bens antes restritos a poucos, como moradia, eletro-eletrônicos, celulares e carros.

Não por menos, embora a densidade populacional do Brasil tenha crescido em aproximadamente 60 milhões de habitantes nos últimos 15 anos, o número de brasileiros vivendo abaixo da linha da pobreza caiu mais de 50% em relação ao início dos anos 90.

Também não foi à toa que o governo Lula abandonou os discursos de campanha para seguir os princípios de gestão adotados por Fernando Henrique. Digo isto com a honestidade de quem acredita que o que realmente importa é que os brasileiros tenham uma vida melhor.

Ninguém bate o Brasil em três reinos: animal, vegetal e mineral. Temos todas as condições de evoluir economicamente, com justiça social, prudência ambiental e austeridade no Poder Público. Ao governo, cabe cuidar com total desvelo dos setores que considero elementares – Educação, Saúde, Segurança, Habitação, Infraestrutura e Saneamento Básico.

Quanto ao futuro do Plano Real, há de se cuidar da correta aplicação do dinheiro público combatendo o déficit causado por desajustes de gestão no controle de gastos. Isto vale para as três esferas.

Seria eficiente se todos os municípios da Federação seguissem práticas de Mogi das Cruzes. Como exemplos, cito os gastos com folha de pagamentos que ficam limitados à faixa dos 35% da arrecadação. Há também o cuidado de priorizar e hierarquizar as necessidades coletivas nos setores essenciais, respeitar e preservar o meio ambiente e impulsionar a iniciativa privada, tanto quanto possível, para gerar empregos e renda.

Entendo que falta ao Brasil realizar uma grande reforma no sistema político e eleitoral, viabilizando maior participação da sociedade nas decisões de governo. Este é o caminho para efetivar as outras imprescindíveis reformas – Tributária, Previdenciária e Trabalhista.

Em suma, a longevidade do Plano Real depende do nível de responsabilidade e comprometimento dos governos. Afinal, temos quase todos os elementos para consolidar, com sustentabilidade, o desenvolvimento econômico e social. Portanto, podemos projetar uma vida melhor.”

Junji Abe (DEM) é ex-prefeito municipal de Mogi das Cruzes