Embora já se tenha falado à exaustão, o episódio da estudante de Turismo Geisy Arruda que virou alvo da ira de alunos e da diretoria da Uniban (Universidade Bandeirante), por causa de um vestido curto, exige uma reflexão bem mais profunda. Não se limita à reintegração ao quadro discente da moça, expulsa arbitrariamente um dia antes. Também não se cinge à postura (má, é bom que se frise) da universidade diante do caso.
Os fatos exibem fraturas no convívio social, expostas num tempo e espaço impensáveis. Pior: protagonizados por pessoas que, em tese, têm informação e formação para abominar a intolerância, a discriminação e os preconceitos de toda ordem.
Tão preocupante quanto as reações atabalhoadas dos executivos da Uniban é o comportamento primitivo dos alunos em relação à colega. No ambiente escolar e em pleno século XXI, agiram como bárbaros na arena da Roma Antiga. Com gestos obscenos e xingamentos violentos, montaram cerco à estudante obrigando-a a se trancar numa sala até que a Polícia chegasse e a conduzisse em segurança para fora da universidade. Tudo isto por causa de uma roupa que julgavam inadequada?
Não é este País de intolerância que queremos. Não são estes os homens e mulheres com quem contamos para conduzir o futuro dos nossos netos. Há algo de muito nefasto se processando nas mentes e almas desses jovens que se revelaram preconceituosos, brutos e covardes – daqueles que têm bravura quando agem em bando, porém, sozinhos, não passam de cordeirinhos.
Igualmente funesta a atitude da universidade. Covarde e precipitadamente, juntou-se à corja de intolerantes para repetir o linchamento moral da aluna, no momento em que ela mais precisava de amparo e proteção. Num rompante nazi-fascista, culpou a vítima. E, fazendo eco a integrantes da massa hostil responsável pelo assédio coletivo, alegou “atitude provocativa” da estudante. Como é?! É o que parece. Na avaliação da Uniban, ela teria provocado os colegas. Ao que me consta, isto é argumento de estuprador...
Em propaganda nos jornais, a universidade anunciou a expulsão da estudante por “desrespeito aos princípios éticos, dignidade acadêmica e moralidade”. Ora, mas são exatamente estes princípios – aliados a conhecimentos elementares de filosofia e sociologia para entender o significado do convívio em sociedade – que se mostraram ausentes nos alunos que hostilizaram a moça e promoveram seu linchamento moral.
De todo o enredo, com transparente urgência de medidas educativas eficientes, a universidade preferiu se livrar do que entendia ser seu único problema: a aluna e seu vestido curto. É fato que a expulsão foi revogada no dia seguinte ao anúncio. É verdade também que a Uniban só voltou atrás por conta da repercussão negativa da decisão. Além de destaque no noticiário nacional, o caso foi parar na mídia internacional, como "The New York Times" e "The Guardian". Até a imprensa do Paquistão achou que a Uniban exagerou.
Não tenho procuração para defender a aluna e nem me cabe determinar a condenação da Uniban. Os desdobramentos judiciais são da alçada dos profissionais e autoridades competentes. Mas, considerando a conduta intempestiva e revoltante dos alunos, assim como as decisões da reitoria da universidade – todas desatinadas e inadmissíveis –, com certeza, serão aplicadas as devidas punições e Geisy será totalmente inocentada.
Creio que Justiça haverá de determinar a indenização da estudante por danos morais, ataque à honra e à dignidade e até por perdas de ordem financeira. Contudo, mesmo com a punição dos culpados e a restituição do que lhe cabe por direito, os estragos psicológicos causados à jovem são irreversíveis.
Por isto, a meu ver, o episódio extrapola questões legais. É preciso que se faça mais. Tanto quanto possível para que evitar o sacrifício cruel de outras Geisys. De gente que sofra calada, longe dos holofotes da mídia.
A sociedade tem de extrair as lições do episódio e, com o apoio de especialistas na área de Educação, trabalhar com afinco para orientar o equilibrado convívio social. Em especial, dos nossos jovens que precisam compreender e absorver os princípios de direito de expressão, respeito à liberdade individual, ética e moralidade. É essencial corrigir distorções, do ponto de vista pedagógico e de formação, para expurgar preconceitos e vencer intolerâncias.
Tanto na escola quanto em casa, precisamos fortalecer a estrutura que dá alicerce aos propósitos de evoluir e conviver bem em sociedade. Caso contrário, surgirão novas fraturas e cada vez menores serão as chances de tratamento eficaz para resgatar a ética, valores morais, dignidade humana e respeito mútuo, bem como preservar o direito de expressão e manter a batalha pela justiça social, livre de discriminações. De raça, credo, classe social, posição econômica, ideias, roupas, de todo tipo.
Junji Abe (DEM) é ex-prefeito de Mogi das Cruzes
Junji,parabéns por sua colocação coerente.
ResponderExcluirSenti uma tremenda indignação, ao ver tantos alunos hostilizando outra colega; a Uniban fugiu dos príncipios éticos da arte docente.
Andressa Leme
Junji, parabéns pela reflexão. Ouvimos tanto sobre este caso, que sobraram "farpas" pra todo lado. Eu resumiria todo este epi´sodio com o seguinte tema: A saia justa do ensino.
ResponderExcluirUm abraço meu amigo e sucessos